A 3ª Vara Cível da Justiça Federal do Amazonas reconheceu a legitimidade da demarcação dos territórios Murutinga e Tracajá do povo Mura, região localizada no município de Autazes, interior do estado do Amazonas. Apesar da decisão ter sido anunciada na última segunda-feira (3), o processo estava sendo questionado na Justiça pelo Sindicato Rural de Autazes, que representa figuras do agronegócio da região. Na ação, o Sindicato deve agora pagar as custas e os honorários do processo.

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
A demarcação das duas terras foi realizada pela então Fundação Nacional do Índio (Funai), em 2012. Conforme o sindicato dos ruralistas de Autazes, o procedimento devia ser anulado por três motivos, conforme detalhou à Justiça:
• A suspeição da antropóloga que embasou o processo em favor dos muras;
• O desrespeito à ampla defesa e ao contraditório;
• E a ausência de posse da área pela comunidade mura na época da promulgação da Constituição de 1988.
A entidade dos produtores rurais da região utilizou o atual “Marco Temporal do Brasil”, tese que propõe que seja apenas reconhecido, aos povos indígenas, o direito às terras que eram ocupadas por eles na data de promulgação da Constituição Federal, o que, em outras palavras, limita o acesso aos territórios e permite que sejam considerados proprietários invasores, como grileiros, madeireiros, empresários do agronegócio e garimpeiros.
Após a análise das provas, o juiz responsável pelo caso considerou que “o processo administrativo seguiu todas as etapas previstas na legislação”. A sentença proferida pelo magistrado concluiu, ainda, que os direitos dos indígenas sobre suas terras são originários, o que faz com que eventuais títulos de propriedade de particulares não tenham validade. Em resposta a decisão da Justiça Federal do Amazonas, o sindicato disse que a assessoria jurídica da entidade está analisando a decisão proferida.
Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), os mura vivem tanto em Autazes como na capital, Manaus, e no município de Borba. Eles são um povo que ocupa áreas no complexo hídrico dos rios Madeira, Amazonas e Purus e segundo a entidade, esse povo sofreu com diversos estigmas e massacres.
Um dos efeitos dos ataques é a própria incorporação da língua portuguesa, que se tornou a principal desde o século XX e do “nheengatu”, sendo que, originalmente, tinham uma língua própria, isolada.
“Devido à ampla mobilidade e dispersão dos mura em um vasto território, as contagens populacionais globais são altamente imprecisas e difíceis de serem realizadas. A reunião dos levantamentos publicados pela Funai, produzidos no âmbito dos processos de regularização fundiária, conduzidos entre 1991 e 2008, apontam para uma população aproximada de 9,3 mil pessoas habitantes de terras indígenas. Este cômputo, entretanto, não incorpora a população de aldeias e terras indígenas cujos processos demarcatórios ainda não foram concluídos, nem sequer os habitantes de centros urbanos, dificultando, ou mesmo impedir, o planejamento de políticas públicas adequadas de atendimento à população mura, tanto nas aldeias quanto nas cidades.”, pontua o ISA, ao descrever o povo mura.